Friday, December 29, 2006

para ti. um ano.

tentei fugir da mancha mais escuraque existe no teu corpo, e desisti.
era pior que a morte o que antevi:era a dor de ficar sem sepultura.
bebi entre os teus flancos a loucurade não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.
só por dentro de ti há corredores e em quartos interiores o cheiro a frutaque veste de frescura a escuridão...
só por dentro de ti rebentam flores.
só por dentro de ti a noite escuta o que sem voz me sai do coração.


david mourão-ferreira

winter collection

suit me

Thursday, December 28, 2006

pai, desta vez vai ser diferente


que tenho o peito crestado da da tua partida
sem te despedires...
sem me deixares ser mulher para saber-to dizer.
tenho um espinho na garganta
outro mais espesso ao longo das costas.
nao digo de ti o que de falta me fazes nos dias,
nao olho para o céu porque sei que podes baixar o teu braço grande e pousar
a tua mão no meu cabelo,
não faço isso, pai, desculpa.tenho medo e tu partiste cedo de mais para mo explicares...
-pai!,pai! a broa está a arrefecer.....e vem ver-me!...por favor, vem ouvir-me dizer que te amo.

Monday, December 04, 2006

pai, desta vez vai ser diferente

-pai!, vem ver a tua menina antes que ela parta para a cidade do estrangeiro... vem ver-me crescida e mulher.

há chouriço na malga,vinho novo no caneco. gosto da tua terra como se fosse a minha. -pai!, o cheiro dos teus casacos e eu tenho os teus olhos para sempre nos meus.vem ver-me crescida, pai, a saber tudo aquilo que me ensinaste. eu tenho os olhos bonitos e estou perdida de saudades tuas.
concertina abafada, a noite cai na terra, ladra um cão, cheira a fumeiro, cheira a terra, pai!
encontro-te dia-a-dia nas coisas porque vejo igual a ti.
nunca cheguei a dizer-to porque nunca tinha perdido ninguém. queria dizer-to mas não sabia que era para sempre.

-pai!, queres ouvir agora?

(cont.)

Sunday, December 03, 2006

canvas

cevada açucarada, manta de lã de ovelha castanha,
os teus pés dentro do meu colo, o domingo dentro do sofá
e uma paisagem fria atenta ao calor dos corpos
num inverno de lábios bem aquecidos.